segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Esse é só o começo do fim da nossa vida

Como descrever uma experiência única, que te abre os olhos? Sempre ficam faltando palavras para expressar as sensações.
Não poderia ser diferente comigo.
Nesse final de semana, participei como voluntária em uma ONG chamada "Um Teto para o meu País". A ONG se propõe a construir casas de emergência em favelas e, durante dois dias, eu e cerca de 20 voluntários alojados em uma escola pública próxima à Osasco, fomos conhecer duas comunidades: Areião e Mareval. O objetivo é aplicar pesquisas, conhecer a realidade daquelas favelas para possivelmente retornar e construir uma casa de madeira segura para algumas daquelas famílias mais necessitadas.

A realidade é que eu não tinha ideia do que estaria por vir ao me inscrever no projeto por influência de um amigo. Não imaginava o que iria sentir.
Todos nós sabemos das condições desiguais do nosso país. Não é fácil discutir a pobreza. Muito menos fácil é vê-la de perto. O que eu vi ali não tem explicação, não tem justificativa. Famílias vivendo sobre esgoto. Crianças brincando em avenidas.
Ainda sim, lembro da frase de uma moradora, Dona Cida, do Areião: "É preciso sorrir". Me comoveu uma pessoa que não tem a menor garantia de nada nessa vida, moradia, comida, emprego, pensar em sorrir.
Estava eu lá, cercada de jovens universitários como eu, de all star, com tantas orpotunidades pela frente, cara a cara com a dura realidade da nossa pátria amada.
Eu iria voltar para casa ao final daqueles dois intensos dias, tomar banho e dormir confortavelmente. Mas, como deixar todas aquelas pessoas lá, em condições absurdas, imundas? Como deixar aquelas crianças, que são obrigadas a amadurecer tão cedo, sem nenhuma perspectiva? Me dói o coração lembrar desse mundo tão feio que faz parte da nossa realidade. Porem é preciso abrir os olhos, é preciso se indignar e fazer algo. Nós aqui somos as pessoas capazes de exigir alguma mudança.
Não quero viver em um mundo tão injusto.
Hoje chove lá fora. Horas e horas de chuva. Eu não estou mais no Areião. Mas como dormir tranquila pensando nas pessoas que moram lá? Todas as famílias que conheci e analisei as condições de moradia? Aquela mãe de duas filhas, com mais uma por vir, com frestas enormes dentro de sua casa? Aquelas famílias vivendo na beira da Marginal Tietê, com suas casas alagadas pelo esgoto? Dona Regina com um bebê de 7 meses em casa?
Hoje eu chorei. Chorei por lembrar de todos que nos receberam com tanto carinho em suas casas despedaças. Chorei porque não é justo.
Mas, sei que dei o primeiro passo rumo à mudança. Porque somos pequenos diante desse mundo aí fora tão grande, mas quero acreditar que podemos fazer a diferença na vida alguém.
Foram muitos sentimentos compartilhados com essas pessoas tão especiais durante esse dias, os voluntários incríveis e amigos que eu fiz lá. A equipe do Teto, responsável, sensível, cativante. Alivia a alma saber que ainda existem pessoas boas. "Deixa chegar o sonho"... o sonho de mudar, o sonho de fazer acontecer e mais ainda: o sonho de devolver a vontade de sonhar para todas aquelas pessoas...

Deixo aqui as palavras do gênio Chico Buarque que sabe, infinitamente melhor do que eu, expressar seus sentimentos:
"Por esse pão pra comer, por esse chão prá dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir,
Deus lhe pague
Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça e a desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair,
Deus lhe pague
Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir
E pelas moscas bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir,
Deus lhe pague"



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